(de)Formação: o que faz um psicanalista?

A pergunta que intitula este pequeno escrito no Glossário de Psicanálise surge carregada de uma ambiguidade imprescindível. Utilizo a palavra imprescindível porque é da mais absoluta importância suscitarmos a reflexão a respeito dos fundamentos sobre os quais a prática psicanalítica vem se constituindo no âmbito da sociedade contemporânea, uma vez que, desde Freud, o laço social sofreu irremediáveis transformações no seu estatuto ontológico. À medida que se torna imprescindível a pergunta acerca do que faz um psicanalista, torna-se também indispensável enveredarmo-nos pelos rumos tomados pela psicanálise no último século e constituir uma explicação acerca da ambiguidade presente nesta reflexão.

Nesta perspectiva, a ambiguidade da questão encontra-se essencialmente no caráter técnico daquilo que o psicanalista faz em seu consultório sem, todavia, desconsiderar o sentido oposto imbuído na fraseologia, posto que ambos os sentidos dessa ambiguidade estruturam uma significativa relação ético-ontológica: o ser e o fazer-se.

Uma vez que pensar sobre o que um psicanalista faz no recôndito do seu consultório implica, irrefragavelmente, questionar o que o faz/torna um psicanalista, percebemos aclarar agora o ponto central desta discussão. A questão sobre o que faz um psicanalista reveste-se de uma equivalência relevante à medida que implica especialmente questionar sobre as bases da formação psicanalítica, ela mesma. Por isso, o sentido expresso no entendimento acerca da clínica encontra-se amalgamado ao sentido acerca da formação do psicanalista.

Destarte, primeiro explicitaremos os fundamentos sobre os quais se sustenta a formação psicanalítica e, posteriormente, adentraremos no caráter clínico/técnico da prática psicanalítica. Assim, a formação do psicanalista não pode prescindir do tripé freudiano, que é formado pelos seguintes elementos: estudos teórico-clínicos, análise pessoal e supervisão clínica.




Os estudos teóricos ou seminários teóricos são desenvolvidos em sala de aula com o auxílio do conjunto das teorias construídas mediante as obras psicanalíticas de Freud, Lacan, Winniccott, Melanie Klein, Wilfred Bion dentre outros, bem como se deve incluir o estudo sistemático de temas específicos dentro das investigações psicanalíticas.

A análise pessoal constitui-se elemento essencial para a formação do psicanalista, uma vez que, à medida que participa dos estudos teóricos, o aspirante a psicanalista deve “encaminhar-se ao divã”, realizando sessões de análise com um psicanalista. Lacan disse que a psicanálise é, antes de qualquer coisa, uma decisão ética. Não existe psicanalista se antes não existir analisando. Como diz o jargão: passa-se do divã para a poltrona, não o contrário.

O terceiro elemento da formação do psicanalista (e não menos importante) é a supervisão clínica. Nesta etapa, o psicanalista em formação desenvolverá, sob a supervisão de sua instituição, sessões de psicanálise com pacientes-piloto. “O psicanalista não se autoriza senão de si mesmo”, insistiu Lacan. Todavia, autoriza-se com base na ética sustentada pelas instituições psicanalíticas desde a fundação da psicanálise. Portanto, o psicanalista se faz no cumprimento ético do tripé instituído por Freud.

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