Crônica: A vida é uma escola

No palco da escola acontecem grandes espetáculos. Professores e estudantes encenam uma belíssima peça teatral, cujo roteiro, lindamente escrito, provoca um misto de emoções. A encenação engloba vários gêneros do teatro: comédia, drama, tragédia… A escola é o palco em que os atores se apresentam para o mundo, numa tentativa desesperada de se qualificarem para espetáculos maiores, mais exuberantes. Sim, espetáculos maiores são aqueles proporcionados pela vida: são a própria vida.

Mas a escola não seria também um aspecto importante da vida?

A escola é a própria vida, mas não é a vida em sua plenitude, embora a plenitude esteja presente no pulsar desse palco iluminado em que artistas-professores e atores-estudantes se encontram, dançam e cantam vivamente.

Como na vida, a escola apresenta desafios. Se nos palcos o roteiro deve estar sempre memorizado para que o espetáculo agrade o público, na escola as falas não são roteirizadas e o público são os próprios autores. As histórias que acontecem na escola são repletas de emoções eminentemente humanas: amor, amizade, raiva, tristeza, alegria, ciúmes, rivalidade, invejas… A escola pulsa porque é composta por membros vivos que sangram, que se despedaçam e choram, abraçam e amam, e que são afetados pelos afetos dos outros.

A escola é gente…

Era uma vez uma escola diferente. No lugar das salas de aulas podia-se ver o palco iluminado em que cada estudante era convidado (não convocado) a apresentar seus talentos e receber uma nota. Os estudantes subiam no palco e a vida se transmutava em luzes coloridas e alegres que transformavam as carrancas em sorrisos. Aquele que se apresentava no palco enchia-se de alegria e satisfação. Aqueles que assistiam, também. E o objetivo das notas era avaliar a beleza e elegância da apresentação, não era depreciar.

Nessa escola não havia provas nem exercícios, porque o roteiro não era escrito previamente. Não era ensaiado, como nos espetáculos de William Shakespeare. Os estudantes-atores apenas subiam no palco e revelavam para o mundo o melhor que traziam no seu interior. Os professores-artistas igualmente.

Não precisava decorar fórmulas matemáticas, tampouco as classes gramaticais. Já era suficiente decorar a alma e esperar a chegada das borboletas na primavera. Era alegre estar entre amigos.

Os atores-estudantes nem imaginavam que suas apresentações eram, por si só, os exercícios e provas. Como não havia pressão, não sentiam medo. Apenas se divertiam.

Na escola existiam muitos desafios, problemas complicadíssimos como artistas-professores tristes e desanimados diante da plateia. Problemas pessoais às vezes tiravam sua alegria. E quando isso acontecia, as crianças se reuniam ao redor do professor-artista e cantavam uma alegre canção, que fazia com que sua alma se enchesse novamente de ânimo. Atores-estudantes também traziam várias dificuldades de casa, como problemas na família, deficiências que exigiam dos artistas-professores um pouco mais de paciência, mesmo não tendo a formação e as ferramentas necessárias para isso.

Às vezes faltavam alguns materiais, mas isso não era suficiente para abalar a alegria da convivência entre amigos que se gostavam de verdade. E quando isso acontecia, todos entravam naquela brincadeira que a Poliana ensinou: o jogo do contente. Sempre havia uma forma positiva de encarar o problema, porque o mais importante era todos estarem juntos para enfrentar as dificuldades de frente, com cabeça erguida e um sorriso no rosto.

Um dia aconteceu uma coisa muito, mas muito chata. Um vírus-antagonista enfurecido saiu pelo mundo contagiando as pessoas. Não era tão contagiante quanto a alegria das crianças brincando no jardim com borboletas e flores, mas era contagioso a ponto de deixar algumas pessoas muito doentes. A escola precisou fechar, porque era perigoso o vírus-antagonista destruir a alegria dos atores-estudantes e dos artistas-professores. Assim, as aulas foram suspensas e o conteúdo pedagógico passou a ser encaminhado para casa. Os atores-estudantes continuavam fazendo suas tarefas, mas agora não havia mais o palco iluminado. A decoração colorida de suas almas foi desbotando e as borboletas não vieram mais alegrar seu jardim interior, como antes.

As facetas socioafetivas desapareceram de suas vidas… e ficaram todos tristes e isolados, vendo as notícias sobre morte e tristeza na televisão.

Mesmo assim, os artistas-professores e os gestores-teatrólogos queriam regar as plantinhas e por isso fizeram um enorme esforço para que o jardim continuasse florido durante esse período de isolamento. Todos se uniram para regar as esperanças dos atores-estudantes, porque depois que as cores desaparecem a esperança continua existindo. É a esperança que nos ajuda a escolher os caminhos do bem. Sem esperança, os artistas-professores e os atores-estudantes ficariam totalmente desamparados diante das dificuldades do mundo.

 

  • Texto publicado originalmente na antologia ATL em Verso e Prosa após conquistar o 2º lugar na categoria crônica do Prêmio Castro Alves de Literatura 2023, organizado pela Academia Teixeirense de Letras (ATL).
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